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Mulher tem a sensibilidade necessária para mudar a realidade

Inovação é desenvolver produtos, processos e serviços que solucione problemas e melhore a vida de alguém, da sociedade

 

  • Publicado: Segunda, 18 de Fevereiro de 2019, 20h58
  • Última atualização em Segunda, 18 de Fevereiro de 2019, 20h59
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Para a Profa. Suezilde Ribeiro ser pesquisadora não é desenvolver uma pesquisa para si, mas para a sociedade. “É preciso sensibilidade para ver o que o ser humano está realmente necessitando... Às vezes definimos um objetivo de pesquisa, mas, muitas vezes, precisamos ter flexibilidade para mudar totalmente, se preciso for”.

 

Nossa entrevistada, em homenagem ao “Dia Internacional da Mulher e das Meninas na Ciência”, comemorado no dia 11 de fevereiro, é do Instituto Federal do Pará (IFPA), Campus Castanhal, a Engenheira Química, especialista em Tecnologia de Alimentos e Mestre e Doutora em Engenharia de Alimentos, Suezilde da Conceição Amaral Ribeiro, filha do Seu Leônidas e da Dona Maria de Nazaré, tem 3 irmãs e 1 irmão. Apaixonada por sua cidade natal, Belém, orgulhosa de ser nortista, profa. Suzi, como é carinhosamente chamada pela comunidade do IFPA, viveu todos os desafios que as mulheres enfrentam para se dedicar de corpo e alma ao ensino, pesquisa, extensão e inovação.

Conta que na infância, inspirada por mulheres como Irmã Dulce, queria ser freira, mas na adolescência vislumbrou outra carreira, Engenharia Naval, início da década de 90, carreira ainda muito restrita ao sexo masculino. Porém, sempre com grande sensibilidade e atenta ao que lhe diziam, foi incentivada por seu professor de Química a escolher o curso de Engenharia Química e por outro professor, por conta da habilidade de repassar conhecimento aos colegas, a se dedicar ao ofício de professora, então desistiu da Marinha.

Como gostava muito de Química, Matemática e Física, na hora de fazer o vestibular, para a Universidade Federal do Pará (UFPA), optou pela Engenharia Química. No mesmo ano, em 1991, também fez o seletivo da antiga Escola Técnica Federal do Pará, que hoje é o Instituto Federal do Pará (IFPA), para o curso Técnico em Edificações. No primeiro curso, o número de mulheres era significativo, porém no segundo, pouquíssimas mulheres faziam parte da turma. Foi uma aluna dedicada nos dois cursos, pois foi uma condição que seu pai impôs para que ela pudesse estudar, além de chegar, no máximo, até as 22:15h em casa, por ser mulher e menor de idade. “Você vai cursar os dois cursos? Você vai estudar de 7:30 as 22:00h? Tudo bem...Essa é a condição: ou vai bem nos dois ou não vai fazer nenhum”, relembra ela ao falar do pai. “Meu pai, mesmo criado numa cultura machista, dizia-me, ‘eu trabalho para que que vocês se formem, trabalhem, e não dependam de homem algum’. Apesar da forma como falava, sempre soube que ele, motorista e barbeiro, assim como minha mãe, auxiliar de enfermagem, trabalhavam duro e incansavelmente para oferecer o melhor para mim e minhas irmãs”, relata profa. Suzi.

No período universitário, profa. Suzi recorda-se que, apesar de ser apaixonada pela área de materiais de construção da Indústria Química, apareceram várias oportunidades de trabalho, mas todas na área de alimentos. Parecia que tudo lhe indicava um novo caminho a ser trilhado. “As outras vagas em engenharia que eu queria muito, exigiam pessoas do sexo masculino. Então, abracei todas as oportunidades que me ofereceram. Com a morte do meu pai, decidi viajar fazer mestrado em Engenharia de Alimentos, na Unicamp, por ser o melhor mestrado do país, avaliado com nota 7. Fiz minha inscrição, juntamente com meu noivo e mais uma amiga, mas como meu currículo ainda era voltado à área de materiais de construção, passei em 11º lugar. Com a mesma determinação e afinco, superei a tristeza de estar longe de casa, estudei muito e ainda enfrentei, de cabeça erguida, alguns preconceitos por ser paraense, mas também recebi muito apoio de amigos, colegas de classe e professores maravilhosos. Fiz muitos amigos, de diversas partes do país, e aprendi muito com eles. Aproveitei cada momento que tive oportunidade na Unicamp. Tirei ótimas notas e mostrei para mim mesma e para quem duvidava que podia ser o que eu quisesse, independentemente de onde eu vinha. Foi então que entrei no doutorado com uma melhor classificação, 3º lugar, também na Unicamp”.

“Cheguei no limite máximo de carga horária possível de disciplinas e ainda fiz algumas disciplinas como ouvinte. Me dediquei muito para tirar excelentes notas. Aproveitei cada momento que tive oportunidade na Unicamp, de 1998 a 2005. Esse é o conselho que sempre dou aos meus alunos.  Dediquem-se e aproveitem as oportunidades”, orienta profa. Suzi.

Profa. Suzi acredita muito em Deus e ressalta que tudo o que conquistou foi resultado de sensibilidade, dedicação, determinação, fé e benção. Conta que seu orientador, Prof. Satoshi Tobinaga, decidiu que sua última orientada seria ela, algo que a emociona até hoje, dada a honra de ter tido tão generoso mestre. Ela obteve, em janeiro de 2005, na Faculdade de Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o título de Doutora em Engenharia de Alimentos, um orgulho para sua família.

 

Concurso e retorno ao Pará

Profa. Suzi, terminou o doutorado e trabalhou na Fundação Educacional de Fernandópolis. Trabalhou também na Escola Técnica Estadual em Casa Branca, ligado ao Centro Paula Souza. E já nesses espaços começou a sua nova fase, de professora, pesquisadora e orientadora.  Mas, o noivo que também foi com ela do Pará para fazer mestrado e doutorado, retornou a Belém, para assumir uma bolsa de Desenvolvimento Científico Regional. Ele sempre ligava e cobrava o retorno dela. Em 2005, surgiu a oportunidade de fazer concurso para professora na Escola Agrotécnica Federal de Castanhal, hoje IFPA – Campus Castanhal. Fez o concurso, foi aprovada e trabalhar lá até hoje.

Naquele tempo de Escola Agrotécnica, não havia laboratórios e estrutura para pesquisa. Então entrou a criatividade, resiliência e capacidade de fazer parceria. “Para não ficar parada, sem pesquisa, procurei meus amigos da UFPA, UEPA e amigos que estudaram comigo na Unicamp e tinham retornadoà Belém para trabalharem na Embrapa. Fiz projetos em parceria com a Embrapa, Universidade Federal do Pará (UFPA) e a Universidade do Estado do Pará (UEPA). Essas parcerias foram essenciais paraque eu não desistisse da pesquisa. Por isso eu afirmo que não se faz pesquisa sozinho e sem otimismo”, comenta.

Devido à ampla experiência e atuação na instituição, atualmente, profa. Suzi é, também, Diretora de Extensão da Pró-reitoria de Extensão (Proex) do IFPA.

Pesquisa

“Não se faz pesquisa sozinho. Para se fazer pesquisa é preciso ter uma rede de relacionamentos, amigos e também fé que tudo dará certo. No meu mestrado, dentro do laboratório de microbiologia da Unicamp, descobri que meu lote de pescado destinado à pesquisa estava contaminado por Salmonella. Fiquei desesperada, no momento, pois sabia que teria que descartar tudo e não haveria tempo suficiente para finalizar minha dissertação e me matricular no doutorado. Foi então que recebi uma prova de que a ciência, em alguns momentos, também precisa da ajuda divina. Um anjo, uma aluna da Unicamp que eu não conhecia, ao ouvir minha conversa com a chefe do laboratório, após pedir desculpas por interromper a conversa, me disse pra eu ficar calma e me contou que o pai era criador de peixes e poderia doar-me a quantidade que eu precisasse”, ressalta  a Profa. Suzi.

Quem se dedica à ciência, trabalha com pesquisa e extensão, também precisa sair do laboratório, ir até as comunidades, aprender a superar os próprios limites e ter coragem, afirma a Profa. “Tenho fobia a lagartas, minhocas e cobras. Tive que vencer meu medo do mato, porque eu precisava fazer coleta, precisava entrar em contato com os produtores rurais. Apesar do medo, nunca me recusei a ir a campo, sempre fiz o que era preciso. Lembro-me que precisei atravessar uma lavoura de girassóis, mas apesar do medo das lagartas, mesmo com pavor, eu fui. Digo que para desenvolver pesquisa e extensão, a gente é capaz de esquecer até os medos, nosso objetivo vai à frente e nos faz vencer os desafios. Pela minha história, tento encorajar os meus alunos a nunca desistirem”.

Profa. Suzi tem muitas histórias de superação e garra para contar. Ela relata uma destas histórias de dedicação, amor à pesquisa e de apoio a seus orientandos para que não se deixem abater com críticas infundadas. Uma destas histórias foi de uma aluna que fez pesquisa sobre os produtores de pescado de seu município e iria fazer uma apresentação oral em um evento científico. A aluna conversando com um dos integrantes da banca, relatou que era de Melgaço e que iria apresentar um trabalho sobre sua cidade. Ele então disse a ela ‘é muito fácil trabalharem Melgaço sendo de Melgaço’, deixando a aluna muito triste. Profa. Suzi, então, a incentivou a reagir. “Disse a minha aluna que voltasse e mostrasse que ela era de Melgaço e que era por isso que está estava lá. Eu disse a ela, quem é que conhece a sua região melhor do que você? Todo mundo conhece teu município pelo menor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH). Mas quem foi lá trabalhar? Que direito alguém tem de dizer para ti que é fácil falar de Melgaço, não sendo de lá? Se fosse fácil fazer pesquisa lá, como estaria este IDH? Se tivesse pesquisa, inovação e desenvolvimento? Se toda transferência de tecnologia existente fosse aplicada em Melgaço o Índice de Desenvolvimento Humano não estaria assim lá. Então, chegue lá e mostre para ele o quanto é difícil trabalhar no seu município. Ela foi e apresentou a pesquisa, afirmou que gostaria de trabalhar naquela região por ser filha de Melgaço. Quem não é desta cidade, não sabe a metade do que eles passam lá. A aluna disse também, aos que assistiam sua apresentação, que buscava braços fortes para trabalhar por Melgaço junto com ela, para desenvolver o desenvolvimento daquela região, pessoas que não somente repetissem que Marajó não tem solução. Ressaltou que sozinha não se faz nada, que sua região tinha muita gente honesta e trabalhadora, que contava com eles para modificar aquela realidade. Fiquei muito orgulhosa por ela”, relembra.

“No Ensino Fundamental, as meninas costumam tirar melhores notas. E quando vai chegando a graduação, os homens começam a se sobressair em relação às mulheres em algumas turmas. Penso que isso ocorre por que alguém ou algo as colocam para baixo, as põe medo, temor, ou lhes dizem que não são capazes.  Quer queira, quer não, a mulher é mais sensível, tem maior sensibilidade que os homens.  Ainda vivemos numa sociedade machista, por exemplo, quando há algum problema familiar é a mulher que tem que dar conta. O filho ainda não é dos dois, sempre é a mulher que tem de largar o emprego, a carreira e os estudos”, explica profa. Suzi sobre uma das razões que dificultam a continuidade das mulheres na pesquisa e que é preciso lutar para modificar.

Inovação

Desde 2005, já são quase 130 discentes da iniciação científica ao doutorado orientados por profa. Suzi. “Ressalto que o objetivo de uma pesquisadora não é desenvolver uma pesquisa para si, mas para a sociedade. É preciso sensibilidade para ver o que o ser humano está realmente necessitando. Às vezes definimos um objetivo de pesquisa, mas, muitas vezes, precisamos ter flexibilidade para mudar totalmente, se preciso for. E para se inovar é preciso esse olhar. Cabe muitas vezes aos pesquisadores desenvolverem inovação. E o que é inovação? É ver o que ninguém vê. É desenvolver produtos, processos e serviços que solucione problemas, que melhore a vida de alguém, da sociedade”.

 

Pesquisa e família

Antes que alguém pergunte, e família? Onde entra o amor? Profa. Suzi, como comentado anteriormente, é casada. Conta que ainda na UFPA, conheceu seu marido, Eder Araujo, com quem tem uma filha de 10 anos, Luisa, o grande amor do casal. O casal foi junto para São Paulo cursar o mestrado e doutorado, superou muitos desafios juntos. “Ciência também combina com família. É importante ter com quem contar e trocar opiniões. Ele foi importante para mim e eu fui muito importante para ele durante os estudos de mestrado e doutorado. Sempre o incentivei ”, destaca.

“Sempre aconselho minhas amigas de trabalho e orientadas a nunca desistirem da pesquisa ou do próprio trabalho porque engravidaram. Desenvolvi várias pesquisas nesse período. Filho não pode ser um empecilho, é uma benção e mais um motivo para dedicar-se mais e cada vez melhor. Os filhos nos têm como exemplo”, aconselha.

 

 

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